terça-feira, 29 de julho de 2008

EDUCAÇÃO E ENSINO SUPERIOR PÚBLICO

EDUCAÇÃO E ENSINO SUPERIOR PÚBLICO
UM IDEAL DE EXCELÊNCIA e A LUTA DIA A DIA PELA QUALIDADE



Para que um país se desenvolva, é preciso que alguns abdiquem de posições privilegiadas no quadro internacional e nacional, em favor dos seus conterrâneos que precisam ser desenvolvidos. E isso só se consegue através da Educação. Quem o fez mais, num quadro de escolha individual racional, do que o professor, aquele, aquela que pôde escolher, abraçar esta bela quão dura profissão? (:Diário do Professor.)


Sabe o professor que escreveu esta passagem, no seu diário reflexivo sobre a profissão, que a transição, da Escola de Elites para a Escola para Todos, não pode, de maneira nenhuma abdicar da exigência de internacionalidade, relevância e excelência.
De maneira nenhuma abdicar da exigência de internacionalidade, relevância e excelência. Uma exigência tridimensional que se alicerça na qualidade. Diariamente trabalhada e dia após dia conquistada.
Sabe este professor e sobretudo o da universidade de elite para a universidade de massas – esta uma realidade nos países mais avançados desde há pelo menos meio século – que para a excelência é essencial a qualidade, que por sua vez é, como se aprende nas universidades de prestígio como queremos a nossa, um processo incremental.
Um processo incremental em direcção ao Amanhã exige, após o sonho, planear por etapas previamente estabelecidas. Primeira etapa: saber quem somos, professores, alunos e estudantes, meio social a nível cultural-económico-integrado, no contexto nacional, local, regional e global. Segunda etapa: planificar acções concretas (a partir do conhecimento obtido na etapa inicial). A terceira etapa é sempre a da avaliação (e decerto sua recorrente revisão).

Um processo incremental em direcção ao Amanhã exige projectar o Futuro. Estamos de olhos para o Futuro, sabendo que há-de custar-nos suor, sangue e lágrimas. Mesmo que esta trilogia ­– que dá o trabalho e os dias – não se veja, porque os calos do trabalhador intelectual não se vêem, a olho nu: estão nas noites de vigília; estão na linha de tensão entre a justiça da avaliação e a justiça das condições que demos todos à pessoa que temos de avaliar; estão no cérebro, fonte da vontade, querer, emoção e razão.
Estão nas noites de vigília a recuperar trabalho docente ou a estudar para melhorar a qualificação, porque de dia há que atender alunos, preparar e dar aulas, gerir as competências de acordo com a vontade individualizada e com a concertada praxis colectiva da polis. Isto, numa sociedade ciosa dos seus direitos a quem temos de ensinar – através dos seus membros susceptíveis de receber essa mudança, os nossos alunos e estudantes – ensinar a equilibrar direitos e deveres.
Estão no cérebro, fonte da inteligência que sustenta tudo. Inteligência da razão e Inteligência da emoção, aquela segundo Descartes e esta por António Damásio, contemporâneo hoje, a falar – sobre a emoção inteligente – verdades fundamentadas no labor quotidiano da ciência. Ciência como a queremos na nossa sonhada universidade pública, deste país de esperança. Ciência como a quis aquele, nosso contemporâneo de há quatro séculos.
Contemporâneo, ele, aprendemos com a História. Mas se não se aprender com a História, o Legislador apressado apodará, com pressa, o Pessoal Docente actual. Pessoal Docente actual caduco, para não dizer ocioso (sem relação com o ócio que deu a Lei da Gravidade de Newton, a Vénus de Milo anónima, a Relatividade einsteiniana – ele que foi, primeiro, rejeitado da universidade, lembram-se?). Esse ocioso outro que é preguiçoso, todo o Pessoal Docente actual. O Legislador apressado, omnisciente por omnivid(v)ência, dita, de cátedra, o Estatuto da Uni-CV. Dita para atirar para o quadro transitório até que desapareça, em amálgama, pior, em massa informe que jamais separou. E não porque jamais houve avaliação sustentada, articulada, às vezes nem mesmo avaliação tout court, em vinte anos, dez, até cinco anos, até …
Pessoal, no sentido colectivo do vocabulário comum, pessoal no seu todo. Uma classificação apressada que não vê uma pessoa, outra pessoa. Pessoas que, afinal, descobrem que o património intelectual, de saberes e competências construídas, gerenciadas, avaliadas ao longo de vinte e nove anos, dez, cinco… até hoje não contam.
Não contam as centenas de horas (trabalho docente que, boa parte do tempo, não conta) a trabalhar estatutos, figurinos, planos curriculares, perfis, listas de equipamentos e bibliografias ponderadíssimas (equilibrar a tensão entre a oferta não discricionária, a necessidade urgente, e a bolsa que nos dizem sempre escassa). A contribuir activamente, com os calos invisíveis, para produzir pareceres, para dar contributos, passe o pleonasmo, para relatórios a editar em organizações internacionais de prestígio, para a nascente universidade. Não, não acredito que uma universidade digna aceite isto, que aceite esta realidade ciberneticamente avatar das ilhas.
Que não conte o facto de que Professores que entram com o nível de Doutor, só é possível quando o indivíduo ou o Estado tenham investido nesse sentido. E Cabo Verde não o fez, a ponto de poder contar com um corpo docente ideal de 75% de doutores.
Que não conte o facto de que 30 anos na vida de um país, de uma Instituição, são tempo de construção.
Que não conte o facto de que esta construção tem de ser feita com pessoas que lutam para obter o grau de doutor, sim.
Que não conte o facto de que esses docentes respondem às necessidades urgentes de formação e qualificação a nível do ensino superior em Cabo Verde.
Que não conte o facto de que esses docentes, lutando para a qualidade do ensino superior, conhecem a realidade económico-social, sociocultural do contexto em que vão actuar.
Que não conte o facto de que os novos cursos, a par dos cursos e reformulados, e respectivas estruturas curriculares foram desenhadas pelos actuais professores do ISE, a partir da experiência obtida através dos anos, e validada por missões internacionais promovidas no âmbito da Uni-CV.
Que não conte o facto de que a qualificação docente tem resultado, e continua a sê-lo, por iniciativa individual.

Concluamos exortando: Um processo incremental em direcção ao Amanhã exige projectar o Futuro, planificar a acção.

ISE na Praia, 24 de Julho de 2008